terça-feira, 15 de maio de 2012

Castelo de cartas

Eu te avisei, moço. Não sou tão bem resolvida quanto pareço.
É fato que as rédeas da minha vida estão sob o meu comando na maior parte do tempo. É certo também que o sorriso no meu rosto e o meu bom astral - que você tanto elogia - não são forçados, mas são frutos de uma vida independente e mais ou menos feliz.

       No entanto, às vezes, sinto-me como um castelo de cartas. Estou de pé, equilibrada, bem construída. Mas basta um vento, um peteleco, um leve balançar em minhas bases para que eu comece a desmoronar.


Uma notícia ruim, seguida de outra. O cansaço do dia-a-dia, a ausência ou a distância de pessoas queridas. O excesso de responsabilidades. A falta de um cafuné num dia de chuva. Uma TPM forte. Uma gripe. Um filme triste ou até um comercial de margarina podem me transformar na mais chata das mulherzinhas.
E foi isso que aconteceu. Quando eu menos esperava, fui invadida por um estranho desejo de ser salva. Nos últimos dias aflorou em mim um forte complexo de Cinderela. Ansiei por alguém que amenizasse o choque entre o mundo adulto e eu.
Tenho plena consciência que este desejo é fruto de memórias e atitudes distorcidas que grande parte das mulheres vivenciou na infância, ou seja, na crença de que uma menina sempre terá alguém mais forte para sustentá-la e defendê-la.
Vejo amigas queridas, mulheres como eu, milhares e milhares de nós, criadas de modo que nos impossibilitam encarar a realidade adulta e assumir a responsabilidade por nós mesmas. Mas esta independência cansa e assusta. Como Cinderela, muitas mulheres de hoje ainda esperam por algo externo que venha transformar suas vidas. De quando em vez, sinto-me tão desamparada que me pego ligando para a minha mãe pedindo colo e só de ouvir um gostoso "estou aqui, minha filha", já me sinto cuidada. 
Mas, "gato", não se preocupe. A farmácia já entregou os medicamentos que a doutora me receitou para combater o quadro de estresse que baixou minha imunidade, trazendo gripe, e que deixou o meu corpo cheio de caroços. No entanto, preciso confessar que o melhor “remédio” foi sua presença ao meu lado hoje de manhã. Ter você na sala de espera, foi muito bom!
Ah... Uma última coisa: fiquei curiosa para saber se você estava preparado para conhecer e cuidar desta minha versão “princesinha indefesa”. Afinal, nós, mulheres, ainda somos cinderelas, mas vejo que o homem de hoje já deixou de ter a postura de príncipe encantado há muito tempo. Sorte de vocês.


Niterói, 15 de maio de 2012.

9 comentários:

  1. Excelente texto, acho que o melhor seu até agora! Ritmo perfeito, frases marcantes... só senti falta de mais um parágrafo antes do último, para trabalhar mais a ideia da menina indefesa, que é muito instigante!
    Parabéns! Bjs

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  2. E percebo como é interessante quando a gente mesmo querendo ou gostando ou precisando dos momentos "mulherzinha", não consegue se desapegar da mais ou menos independência, da supostamente estruturada felicidade... Adoro o namorado fazendo cafuné... e as vezes perder o chão quando ele está longe... o negócio - e só o tempo dirá - é saber se estou preparada ou aberta para isso. Aberta para "abrir mão" da tal independência e de uma felicidade que parece só depender de mim... só parece...

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  3. Amiga,
    também me pego assim de vez em quando. Apesar da aparência de cinderela indefesa, procuro manter minha autoresistência,até que um vento, uma chuva, ou um comercial de margarina derruba o meu frágil castelo de cartas! Nessas horas as pessoas queridas são os alicerces para recuperar a minha estrutura, e até isso acontecer nada melhor do que o carinho do namorado, o colo da mamãe ou de um(a) amigo(a) querido(a). Nós mulheres somos assim mesmo. Adoro me dar o direito de curtir meu lado mulherzinha em aguns momentos. Olha, admitir fragilidade em alguns momentos é um sinal de maturidade.
    Beijo grandão com saudade amiga! MAs colo, só à distãncia por enquanto

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  4. É como eu sempre digo: a sorte de nascer atualmente é poder escolher qualquer personagem de tempos idos. Se hoje você quer se vestir de princesa, amanha veste uma máscara e faz a heroína e assim vamos, um dia após o outro.

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  5. Parabéns pelo texto!!!!
    Está enxuto, direto e objetivo, ao mesmo tempo divertido e mostrando todas as nossas nuances femininas. Ou seja: está na medida querida!!!
    Parabéns!!!
    Bjs!!!

    Verônica

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  6. Bia, texto perfeito! Gostei mesmo!!
    Nunca parei pra pensar nisso, mas eu também tenho complexos de Cinderela do nada! rsrs

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  7. Perfeito. Como sempre.
    Instigante, sensato e com um tom humorístico, a Bia de sempre.

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  8. Bia , seja quem for o gato preocupa não. Homen gosta mesmo e do tipo fragil saca? Mulher independente e resolvida só faz sucesso em romance e novela das oito... então capricha ai na sindrome de cinderela, que eles adoram...
    beijos
    Leila

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  9. Bia,
    Estou falando sério: seus textos estão muitoooo bons!
    Somos como caleidoscópios, não é mesmo? Somos de tudo um pouco....mas adoro essa nossa inconstância, essa complexidade feminina!Bjão e vai fundo!!

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